Despedida
- Detalhes
- By Raimundo Corrêa
- Coletânea: Primeiros sonhos
Tu vaes ! Que nuvem reveste
Teus olhos d'azul celeste
D'onde em fio o pranto cáe !
São justas as tuas queixas,
Não só porque o berço deixas,
Mas porque deixas teu pae !
Dissipas tantos anhelos,
Tantos aéreos castellos,
Que elle só por ti constróe !
E arrependida no entanto
Tu choras, nadas em pranto,
Pranto que muito lhe dóe !
— Perla cahida do engaste —
Deixas o berço onde amaste
Cândidos sonhos sonhar,
Cândidos como os arminhos
Como a pennugem dos ninhos
Como as espumas do mar...
E vaes viver na orphandade
Sem orphã seres, na idade,
Na idade d'alma illusão,
Na idade grande em que a gente,
Começa a sonhar e sente
Que tem também coração !
Ri-te o mundo falso, como
A rosea casca de um pomo
De polpa e sabor lethal,
Veia, que brilha fugace,
Crystallina, pela lace
Dúbia de algum tremedal.
Vae ! Mas a casa deserta,
E a mesma veiga coberta
Das florescencias de Abril,
E mobil a mesma brisa,
Que palpita e que deslisa
Nas ramas do taquaril,
E os mesmos pobres logares,
Que deixas, quando voltares
De lá, por certo acharás,
A mesma agreste alegria,
Tudo o mesmo... e todavia
A mesma tu não serás !
Choras — teu pae também chora,
Poupa-lhe aos olhos agora
Em fio o pranto que cáe ;
Não sei quem mór dor partilha,
Se é o pae, que chora a filha,
Se a filha, que chora o pae !
1877.