Primeiros sonhos
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- By Raimundo Corrêa
- Coletânea: Primeiros sonhos
Ha d'este livro, que ides lêr, nas paginas,
Ou tristes, ou risonhos,
Os quadros mal traçados, mas verídicos
Dos meus primeiros sonhos.
Não m'os inspira o mundo — orbita escura
De hiantes precipícios,
Enigma que enlouquece, pandemônio,
Catastrophe de vicios
E de ambições tantalicas. Hippocrita,
Que apunhala, que enréda,
E mostra sempre junto honra o escarneo,
Junto ao fastigio — a queda...
Calcinação das almas, que as comprime
Na garra áspera, adunca...
O mundo que eu conheço e que detesto
Nunca me inspira, nunca !...
Sómente inspiram-me esses pobres versos,
Deus, o amor, a família,
É a paz nas solidões onde sem mascara
A natureza brilha.
Oh ! natureza ! a ti se erguem meus cânticos
Estou na flor da idade —
Abriram-se os portaes resplandecentes
Da minha mocídade,
E minh'alma febril da ardente quadra
O clarão reverbera...
Aves ! saudae as límpidas auroras
Da minha primavera !
Florestas virgens, gigantescas arvores,
Torrentes chrystallinas,
Rócio celeste a scintillar nos cálices
Das humidas boninas,
Luz indecisa do cahir da noite,
Do levantar do dia,
Intermittentes auras, sons monótonos
De catadupa fria...
Tremei, sorri, brilhae, erguei mil cânticos
Estou na flor da idade !
Abriram-se os portaes resplandecentes
Da minha mocidade !
Sou moço ! No meu peito não germina
A flor dos desenganos,
De sonhos se enche o paramo estrellado
Dos meus desenove annos !
Sei sentir ! Sei sonhar ! Ha notas férvidas
Na minha lyra rude,
São as flores sylvestres de minh'alma,
Rosas da juventude,
Que, mal se abrem, do mundo são levadas
Nos vórtices medonhos...
Eis o meu livro — pallido simulacro
D os meus primeiros sonhos