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A cabeça do corvo

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By Alphonsus de Guimaraens
Alphonsus de Guimaraens
Coletânea: Kyriale

(Ao Dr. Edmundo Luís)

Na mesa, quando em meio à noite lenta
Escrevo antes que o sono me adormeça,
Tenho o negro tinteiro que a cabeça
De um corvo representa.

A contemplá-lo mudamente fico
E numa dor atroz mais me concentro:
E entreabrindo-lhe o grande e fino bico,
Meto-lhe a pena pela goela a dentro.

E solitariamente, pouco a pouco,
Do bojo tiro a pena, rasa em tinta...
E a minha mão, que treme toda, pinta
Versos próprios de um louco.

E o aberto olhar vidrado da funesta
Ave que representa o meu tinteiro,
Vai-me seguindo a mão, que corre lesta.
Toda a tremer pelo papel inteiro.

Dizem-me todos que atirar eu devo
Trevas em fora este agourento corvo,
Pois dele sangra o desespero torvo
Destes versos que escrevo. 

  1. Spectrum
  2. Visão dos solitários
  3. Presságios
  4. Ascetas
  5. Espírito mau
  6. Ladainha dos quatro santos
  7. Initium
  8. Dies irae
  9. Meia-noite
  10. São Bom Jesus de Matosinho
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