(A Augusto de Viana do Castelo)
Cheguei à meia-noite em ponto.
O caso deu-se como eu conto,
Cheio de lúgubre mistério...
Pois ela disse: “Ao cemitério
Vamos à meia-noite em ponto.”
E eu respondi-lhe: “Conto, conto
Contigo à meia-noite em ponto.”
Como eu sabia, ela outro amante
Tivera em tempo não distante.
Era já morto: eu uma esposa
Tinha também sob uma lousa.
E ela sabia dessa amante.
Jaziam, um do outro distante,
O amante dela e a minha amante.
Bem não chegamos, os ciprestes
Agitaram as verdes vestes
Como arrojando-se de bruços...
Que ais de tristeza e que soluços
Gemeram tão verdes ciprestes.
Gemia o vento pelas vestes
Verdes dos vírides ciprestes.
Paramos de repente à porta:
Eu era um morto, ela uma morta
Tal foi a cena branca e nua
Que nós, clareados pela lua,
Olhamos bem ao pé da porta.
Eu era um morto, ela uma morta.
Sem movimento junto à porta.
Diante de nós, em frente, diante,
O amante dela e a minha amante,
Espectros vis num mesmo quadro,
Vinham vagar, hirtos, pelo adro,
Diante de nós, em frente, diante..
O amante dela e a minha amante
Riram, passando para diante. 

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