O sopro fagueiro de brisa macia
Teu barco movia,
Teu barco impelia
Para longe de mim;
E eu, enquanto ele levar-se deixava,
Sozinha chorava,
Sozinha acusava
Meu fado ruim.
Chorava, porque partias
Para tão longo cruzeiro;
Porque via o teu navio
De mim fugir tão ligeiro,
E tu de lá me mandares
Um triste adeus derradeiro.
Depois, como a noite seu manto estendia,
E quase envolvia
Teu barco, que ia
Correndo veloz,
Que olhar de saudade, de intensa amargura,
De terna tristura,
Com triste ternura
Minha alma lhe pôs!
Que olhar de amoroso anseio,
De tantas angústias cheio,
No teu navio fitei!
De rasgar, anjo querido,
Esse manto denegrido
Quanto o poder almejei!
“Meu Deus! meu Deus! eu dizia:
Tu, que vês quanto o adoro,
Traze depressa a meus braços
O consorte, por quem choro!
Faze que um pronto regresso
A mim, Senhor, o conduza;
Dá-me tu, que tanto podes,
O que o fado me recusa!”
Quando à noite em nossos lares
Tão solitária me achei,
E o lugar, em que te via,
Tão vazio contemplei,
Com que pungente saudade
Tristes prantos renovei!
Cheguei a pedir ao vento...
— Que insensato pensamento! —
Me viesse arrebatar,
E que me fosse a teu lado,
No sopro mais perfumado,
Ditosa e leda pousar!
Se tu, meu ídolo amado,
Se tu pudesses então,
Embebendo as tuas vistas
Dentro do meu coração,
Ver como o dilacerava
Da saudade a negra mão,
Oh! que bem conhecerias
O que dizer-te não sei;
Oh! que jamais duvidaras
Do amor que te jurei,
Nesses olhares de fogo,
Com que tua alma queimei.
Sim, verias que te amo,
Quanto à flora a primavera;
Quanto a mãe ao tenro filho,
Pelo qual morrer quisera.
Qual o que tinha Moisés
A palavra do Senhor;
Qual o que na cruz sentia
Dos homens o Redentor;
Dedicado, ardente, imenso,
Assim é o meu amor!
Como pela luz o cego,
Pela pátria o exilado,
Pelo céu, da fé o mártir,
Pela vida o condenado,
Suspiro porque haja breve
Tua ausência de findar,
E que esta sede de ver-te
Possa em teus olhos matar.
Inda quatro longos dias
De insofríveis agonias
A separar-nos estão!...
Bias, que mais e mais crescem;
Que quatro séculos parecem,
Que lentos passando vão!
Oh! praza a Deus que infinita
Sejas tu, hora bendita,
Que nos deves reunir;
Que assim nos terás vingado
Da tirania do fado
Que teima em nos perseguir!
Então esta pobre vida,
De tantos males tecida,
Poderemos esquecer;
E a nossa oblação mais pura
A Deus, por tanta ventura,
Agradecidos render.